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Black Mirror 7×05: Paul Giamatti é gigante

Paul Giamatti chora emocionado, enquanto olha para frente.

Paul Giamatti brilha em Black Mirror. Foto: divulgação.

“Eulogy”, quinto episódio da sétima temporada de Black Mirror, é uma das experiências mais delicadas, comoventes e humanas que a série já proporcionou. Escrito por Charlie Brooker e Ella Road, e dirigido pela dupla Chris Barrett e Luke Taylor, o episódio subverte as expectativas habituais da antologia, trocando o tom distópico por uma melancolia profundamente íntima. Estreado em 10 de abril de 2025 na Netflix, o capítulo entrega uma das narrativas mais sensíveis da série — talvez a mais. Considero um “presente” necessário depois do espetacular, mas perturbador episódio de estreia desta temporada (leia aqui a crítica).

No centro da trama está Phillip (Paul Giamatti, em atuação magistral), um homem solitário que, ao saber da morte de sua antiga namorada Carol, decide revisitar as memórias do relacionamento que tiveram. Ele utiliza uma tecnologia de reconstrução de lembranças para compilar imagens, sons e textos com o intuito de entregá-los à família dela. É nesse processo que surge “The Guide” (Patsy Ferran), uma espécie de inteligência artificial que mais tarde se revela como uma representação digital de Kelly, filha de Carol — e fruto de um relacionamento que Phillip jamais soube que existiu.

O mergulho de Phillip nas memórias o conduz a revelações dolorosas, especialmente a uma carta que nunca chegou a ler, na qual Carol contava sobre uma gravidez inesperada e repentina (um filho que não era dele) e expressava o desejo de reconciliação. O episódio, então, desloca-se para o terreno do arrependimento: não o simples lamento, mas o tipo de arrependimento que molda uma vida, que reescreve o passado com a tinta amarga do “e se”.

Paul Giamatti é o coração do episódio. Com domínio absoluto das emoções, ele transita da raiva à perplexidade, da dor ao luto, carregando quase sozinho a narrativa. Patsy Ferran, embora com menos tempo de tela, entrega uma presença sutil e marcante — seu personagem é tanto guia quanto espelho das ausências de Phillip. O episódio caminha como um monólogo visual, repleto de silêncios significativos, memórias fragmentadas e dor contida.

O ápice emocional acontece no funeral de Carol, quando Kelly toca ao violoncelo uma peça composta por sua mãe. É a catarse final — não uma reconciliação com o passado, mas uma aceitação daquilo que não poderá mais ser mudado. A tecnologia, neste episódio, não aparece como punição ou ameaça, como tantas vezes em Black Mirror, mas como uma ponte frágil entre o passado e o presente, entre a ausência e o reencontro.

“Eulogy” não oferece redenção, apenas compreensão. E talvez isso seja suficiente. A vida, parece dizer o episódio, é feita dos caminhos que escolhemos não trilhar — e a memória, quando resgatada com honestidade, pode nos oferecer não alívio, mas sentido.

Trata-se de uma narrativa sobre a dor das oportunidades perdidas, sobre dois amantes que, embora jamais tenham realmente se afastado emocionalmente, permitiram que o tempo e o orgulho os separassem. O episódio mostra que a vida, ao contrário da tecnologia, não tem função “desfazer”. “Eulogy” não apenas emociona; ele permanece. É um dos pontos mais altos de Black Mirror, não por prever o futuro, mas por olhar fundo no que há de mais humano em nós.


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