14 de março de 2025
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A incrível história dos cabos submarinos

Os cabos submarinos são a espinha dorsal da comunicação global. São eles os responsáveis por transmitir a maior parte do tráfego de dados digitais (99%) entre continentes. Essa história tem mais de 150 anos.
8 de março de 2025
Cabo submarino no fundo do mar
Cabo submarino no fundo do mar. Foto: Airtel.

A internet que você tem em casa pode até ser sem fio, mas para ela chegar até aí, cabos e mais cabos foram usados. E eu não estou me referindo apenas aos cabos de fibra ótica que a sua operadora instala em sua rua e no prédio, estou me referindo aos cabos submarinos. Isso mesmo que você acabou de ler. Para que os países e os continentes fiquem conectados uns com os outros, as empresas de comunicação utilizam cabos que percorrem milhares de quilômetros debaixo do oceano!

Os cabos submarinos são a espinha dorsal da comunicação global. São eles os responsáveis por transmitir a maior parte do tráfego de dados digitais (99%) entre continentes (satélites transportam apenas uma fração). Apesar de sua importância, esses cabos permanecem invisíveis para a maioria das pessoas, operando, silenciosamente, no fundo dos oceanos, e garantindo o funcionamento da internet como a conhecemos hoje.

Mas o que são esses cabos?

Os cabos submarinos são estruturas compostas por várias camadas de proteção, com fibras ópticas em seu núcleo, responsáveis por transmitir dados na forma de sinais de luz. Esses cabos podem ter milhares de quilômetros de extensão e são projetados para resistir a condições adversas do ambiente marinho, como correntes oceânicas, mudanças de temperatura e ataques de animais marinhos.

Reparar um cabo submarino danificado requer navios especializados e pode levar semanas ou meses, dependendo da localização e das condições do mar. Em regiões profundas do oceano, como a Fossa das Marianas, os reparos podem ser extremamente difíceis.

A instalação dos cabos submarinos é feita com navios, que vão despejando os cabos, metro a metro, no fundo do mar. A instalação em alto-mar é realizada por navios especializados em laying (colocação). Com o tempo, as empresas foram sofisticando os cabos e navios, e desenvolveram novas técnicas de instalação.

A história dos cabos submarinos

A primeira coisa que você precisa saber é que o telégrafo foi inventado em 1837 por Samuel Morse nos Estados Unidos e aperfeiçoado por outros inventores nos anos seguintes. O telégrafo, trocando em miúdos, é um dispositivo de comunicação que transmite mensagens à distância por meio de sinais elétricos ou mecânicos.

A coisa funcionava desse jeito: o operador digitava a mensagem usando um chaveador telegráfico; a mensagem era codificada em Código Morse (pontos e traços); os sinais elétricos viajavam por fios de cobre até outra estação; o operador do outro lado decifrava e escrevia a mensagem.

Organizado pelos historiadores Francisco Carlos Teixeira da Silva, Francisco Eduardo Alves de Almeida — professores e pesquisadores da Escola de Guerra Naval — e Karl Schurster — professor da Universidade de Pernambuco —, este livro é uma compilação de estudos que, da Antiguidade Clássica até o século XXI, abordam de forma pormenorizada aspectos históricos, políticos e militares do oceano Atlântico. Confira aqui.

Esse equipamento revolucionou a comunicação global. Antes, a principal forma de comunicação entres países e continentes dependia de cartas enviadas por navio. Isso levava semanas e até mesmo meses. Com o telégrafo, tudo muda. A comunicação se tornou muito mais rápida.

As empresas de comunicação rapidamente espalharam postes por boa parte da Europa e dos Estados Unidos. Na década de 1840, já havia uma ampla rede conectando cidades e até países. Isso revolucionou o comércio, o jornalismo, a diplomacia, as operações militares e o governo. O mundo ficou maior, pois todos estavam mais conectados.

Linhas de telégrafo em operação no mundo em 1880. Arquivo Nacional.

Um problema, contudo, tirava o sono das empresas de comunicação e dos governos: se os países de um mesmo continente estão já conectados pelo telégrafo, como podemos conectar países que são separados por mares? Se não se pode instalar postes de comunicação, como estabelecer a conexão?

A resposta foi: vamos levar os pulsos elétricos de um ponto a outro instalando fios debaixo da água. Em 1850, foi instalado o primeiro cabo submarino foi instalado, no Canal da Mancha, conectando a Inglaterra à França. Deu certo, mas a experiência teve vida curta, devido a problemas técnicos e sabotagem. Em 1851, um novo cabo, mais resistente e funcional, foi instalado com sucesso na mesma rota.

1965. Cabo submarino. Autor: anônimo. Arquivo da Fundação Telefónica.

Em 1858, os engenheiros deram um passo mais ousado: a instalação (bem-sucedida) do primeiro cabo transatlântico, conectando os EUA (Terra Nova) ao Reino Unido (Irlanda). “Onze dias após a união ter ocorrido, a primeira mensagem foi enviada: uma mensagem de congratulações da Rainha Victoria ao então presidente dos EUA, James Buchanan. A mensagem levou 17 dias para chegar, mas, embora possa parecer muito tempo agora, na época foi um grande sucesso”.

Mas não pense que essa história é feita apenas de sucessos. Em 1859, por exemplo, um cabo submarino foi instalado ao longo do Mar Vermelho para conectar-se à Índia, mas falhou, custando ao governo britânico a bagatela de £ 800.000. Segundo o pesquisador Mauro Costa da Silva, “A história do desenvolvimento dos cabos submarinos é contada como uma sucessão de tentativas e erros, principalmente na instalação de cabos com grande extensão. Isso indica o desconhecimento prévio dos engenheiros sobre as agruras dessa tecnologia. Foi a partir das falhas encontradas na operação de grandes cabos submarinos que cientistas despertaram interesse sobre o entendimento da propagação de sinais elétricos”.

No século XX, vale a pena dizer os cabos passaram a ser instalados não mais para conectar as pessoas através do telégrafo, que acabou aposentado, mas por telefone e internet. Em 1988, o TAT-8 se tornou o primeiro cabo submarino de fibra ótica. “Formado por um consórcio de operadoras (AT&T, FT e BT entre outras), o TAT-8 tinha inicialmente capacidade para 40.000 circuitos telefônicos (ou seja, chamadas simultâneas) entre França, Estados Unidos e Reino Unido”. Veja uma linha do tempo aqui.

O primeiro cabo telegráfico transatlântico no Brasil foi inaugurado em 1874, conectando a praia de Carcavelos, a 21 km de Libsoa, em Portugal, à Recife, com conexões na Ilha da Madeira e Cabo Verde.

Caixa de amostra de cabo do Rio de Janeiro para o Pará presenteada à sobrinha de Lord Kelvin, Ina Bottomley, 1873. (Museu Hunterian, Glasgow).

“Em 1874, pela primeira vez, os jornais brasileiros puderam publicar notícias da Europa do dia anterior”, disse o jornalista Pedro Aguiar, da Universidade Federal Fluminense (UFF), estudioso do sistema de circulação de notícias internacionais, à reportagem da Revista Pesquisa Fapesp.

Mas quem paga por isso?

Hoje, mais de 95% das comunicações intercontinentais da internet são realizadas por meio de cabos submarinos. Grandes empresas de tecnologia, como Google, Facebook e Amazon, investem bilhões de dólares nessa infraestrutura, garantindo conexões mais rápidas e estáveis. Sem esses cabos, a transmissão de dados dependeria de satélites, que possuem menor capacidade e maior latência. E são também muito mais caros.

Como o custo de um cabo submarino pode chegar a centenas de milhões de dólares, muitas empresas se unem para dividir os custos e compartilhar a capacidade do cabo. O cabo Marea, por exemplo, que liga os EUA à Espanha, foi financiado por Microsoft, Meta e a operadora espanhola Telxius. As empresas que investem nos cabos, por sua vez, vendem capacidade de transmissão para operadoras e provedores de internet. Algumas grandes empresas usam os cabos para infraestrutura própria, reduzindo custos com terceiros.

1983. Implantação do OPTICAN-1. Autor: anônimo. Arquivo da Fundação Telefónica.

Apesar de serem construídos com alta resistência, os cabos submarinos enfrentam ameaças constantes. Acidentes com âncoras de navios, desastres naturais, terremotos submarinos e ataques de tubarões podem danificá-los. Além disso, há preocupações geopolíticas, pois o controle sobre esses cabos pode representar uma vantagem estratégica para nações e empresas.

A demanda por conectividade global continua crescendo, impulsionada pelo aumento no consumo de dados, inteligência artificial e internet das coisas (IoT). Novos cabos estão sendo constantemente instalados para atender a essa demanda, incluindo projetos que conectam regiões remotas e aumentam a redundância da rede global.

Submarine Cable Map

Se você gosta do tema, vale a pena visitar o site Submarine Cable Map, que é um mapa interativo que exibe os cabos submarinos de telecomunicações ao redor do mundo. Ele mostra as rotas desses cabos, que são essenciais para a transmissão de dados e a conectividade global da internet.

Mapa com cabos submarinos ao redor do mundo.
Cabos submarinos conectando, hoje, o mundo todo. Imagem: Submarine Cable Map.

O mapa é mantido pela TeleGeography, uma empresa especializada em pesquisa de telecomunicações, e contém informações detalhadas sobre cada cabo, como o ano de ativação, os operadores responsáveis e os pontos de ancoragem em diferentes países. Segundo o relatório da empresa de 2025, “apesar de algumas flutuações, os investimentos em novos cabos têm atingido uma média de mais de 2 bilhões de dólares por ano nos últimos oito anos. O valor dos novos cabos submarinos que entrarão em operação entre 2024 e 2026 está previsto para superar os 10 bilhões de dólares”.

Ele é útil para entender a infraestrutura da internet global, identificar possíveis vulnerabilidades e analisar como o tráfego de dados é distribuído entre continentes.

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Ana Paula Tavares

Jornalista formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Mestre em História Política e Bens Culturais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Trabalhou na Globosat e na Fundação Roberto Marinho. Atualmente, é redatora-chefe do Bonecas Russas e subeditora do Portal Café História. Adora Jane Austen, The Office e mora em Brasília.

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